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OBRA ÉDITA · FACSIMILE · INFO
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António Mora

Apareceu então (século XIX) em sua plena florescência o cortejo inteiro...

Apareceu então (século XIX) em sua plena florescência o cortejo inteiro das teorias igualitárias, com a tripla violação dos princípios naturais da vida social. Apareceu o igualitarismo, violando o princípio do domínio de classe, essência da disciplina e da ordem sociais. Apareceu o igualitarismo sexual, violação da unidade familiar, essência de conservação dos costumes e da ordenação moral da vida das sociedades. Apareceu o igualitarismo nacional, violando o direito natural da nação mais forte ou mais bem organizada a tomar a ofensiva contra a nação mais fraca, e a compeli-la a tomar o caminho da civilização.

Nenhum destes princípios se aplicou bem ou propriamente, por duas razões, que no fundo se reduzem à mesma. Os princípios citados são, de sua natureza, inaplicáveis à vida social, que cessaria se eles o fossem. :De modo que a tentativa da sua aplicação dá três resultados: primeiro, a anarquia social; depois, a vitória dos mais audazes e dos mais inferiormente fortes, resultado de tal anarquia; depois a degenerescência geral, fruto de se haverem promulgado como teorias tais degenerados princípios.

De certo modo, porém, as sociedades conservaram um relativo equilíbrio pela acção dos próprios factores que haviam produzido a eclosão dessas teorias utópicas. Assim, o acréscimo na intensidade da vida económica apertou à roda do proletariado um círculo de ferro que, de certo modo, o escravizou; assim a Natureza vingou-se dos utopistas, e, onde estava abolida a servidão como fórmula social, as leis económicas a reintroduziram, para que a sociedade não morresse. O próprio desvio económico que lançara para a vida masculina do trabalho as mulheres esterilizava-as ou maltratava-as com isso. No campo prático elas ficavam menos ao abrigo, e a sua inferioridade ressaltava. O pacifismo idealista levou as nações que hoje formam a Aliança a um estado de quase não defesa ante a agressão germânica (?????)

1917?

Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação. Fernando Pessoa. (Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1996.

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